(*) Por Clarice Gulyas
O destino de meio milhão de trabalhadores do setor
frigorífico está prestes a ser mudado. A regulamentação da categoria pode
entrar em vigor nos próximos meses com a aprovação do texto final de uma Norma
Regulamentadora (NR) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Com alto índice
de acidentes e doenças ocupacionais, uma comissão tripartite envolvendo
representantes do Governo Federal, da indústria e dos trabalhadores volta a
discutir nos dias 23 e 24 de maio as principais necessidades do setor, em Brasília.
Só no Distrito Federal, cerca de 4 mil trabalhadores serão beneficiados. A
previsão é que a norma entre em vigor até outubro.
Entre as principais mudanças em torno da segurança
e da saúde nos frigoríficos, o texto técnico básico sobre a norma propõe pausas
de 10 minutos a cada 50 minutos trabalhados. A proposta defendida pela
Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação e Afins
(CNTA), aprovada no último Congresso da categoria, é mais abrangente: exige a
redução da jornada de trabalho de 7h20 para 6 horas diárias, fornecimento de
lanche pelas empresas a cada 3 horas de trabalho, piso salarial de R$ 1 mil e
mudança no sistema médico do trabalho. A regulamentação também prevê
instalações de assentos nos postos de trabalho que permitam a alternância das
posições em pé e sentado, com o objetivo de diminuir os impactos provocados por
trabalhos penosos que exigem grande esforço físico e movimentos repetitivos,
muito comuns no setor.
Para Artur Bueno (foto), presidente CNTA, o
investimento constante da entidade em assessoria técnica aos representantes dos
trabalhadores que participam da elaboração da norma tem sido essencial ao longo
das negociações. A expectativa, segundo Artur, é que a NR dos Frigoríficos
atenda às necessidades dos trabalhadores o quanto antes. “Temos acompanhado
através das entidades sindicais a questão dos acidentes, sobretudo no setor de
desossa onde o esforço repetitivo é muito grande, e temos orientado a cobrança
efetiva das empresas na melhoria das condições de trabalho. Essas necessidades
são prioritárias para a categoria e caso não sejam atendidas com eficiência,
seremos obrigados a partir para a mobilização nacional”, defende.
Na última quinta (17/5), a Primeira Turma do
Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou a empresa Mafrig Alimentos S.A. a
pagar 7h20 semanais a uma trabalhadora que não usufruiu do intervalo de
trabalho para recuperação térmica a que tinha direito.
Mais proteção para o trabalhador
As empresas também devem treinar os funcionários
quanto ao uso de equipamentos e ferramentas de trabalho, além de adotar medidas
de prevenção coletivas e individuais com constante avaliação de riscos. Para
isso, deverão ser criados programas específicos de prevenção com participação
de um clínico-epidemiológico que irá orientar as medidas a serem implementadas
pelos programas no ambiente e nas condições gerais de trabalho, considerando a
realização de consultas médicas aos trabalhadores, aplicação de questionários e
análises, e ainda alertando os empregadores sobre situações que possam gerar
riscos, especialmente, quando houver nexo causal entre as queixas e agravos à
saúde dos trabalhadores e às situações de trabalho a que ficam expostos, ainda
que sem qualquer sintoma ou sinal clínico.
A engenheira de Segurança do Trabalho, Maria Elídia
Vicente, assessora dos trabalhadores no Grupo Técnico Tripartite de elaboração
da Norma do Setor de Frigoríficos, explica que a instituição de pausas durante
a jornada de trabalho é essencial para diminuir o índice de lesões provocadas,
principalmente, nos tendões e articulações como as Lesões por Esforço
Repetitivo (LER) e os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho
(DORT). "Os especialistas estimam que o líquido sinovial, responsável
pela lubrificação das articulações, deixe de ser produzido em atividades
repetitivas a partir de 50 minutos a 60 minutos e que uma pausa de 8 a 10
minutos a partir deste momento é de vital importância para que o líquido
sinovial volte a ser produzido em quantidade suficiente“, afirma.
Acidentes de trabalho e impacto financeiro
Segundo dados da Classificação Nacional de
Atividades Econômicas (CNAE), fornecidos pelo pesquisador Paulo Rogério
Oliveira, coordenador-geral de Politicas de Combate a Acidentes de Trabalho do
Ministério da Previdência Social, dos 70 mil benefícios mantidos pelo INSS,
entre 2000 e 2008, envolvendo transtornos dos tecidos moles (conjuntivo,
epitelial e muscular), 1.017,38 foram destinados ao setor de abate de bovinos e
1.229,18 às avícolas. Esse número representa 3,53% afastamentos a mais do que a
população segurada em geral, e até 4,26% quando diz respeito ao abate de aves e
outros pequenos animais. Dados mais recentes do número total de acidentes de
trabalho envolvendo o setor frigorífico em geral no período de 2008 a 2010
registraram mais de 61 mil acidentes, sendo 22.654 no setor bovino e 38.520 em
avícolas.
Sobre o investimento no setor, a advogada
trabalhista Rita de Cássia Vivas avalia que além de melhorar as condições de
trabalho e a produtividade nas empresas, a iniciativa irá contribuir ainda para
economizar o gasto dos cofres públicos em relação aos afastamentos pelos INSS.
“Toda sociedade, neste momento, deve se unir visando à redução ou, se possível,
até mesmo a eliminação por completo dos acidentes de trabalho, haja vista que
as perdas ocasionadas em casos de acidentes não se restringem ao âmbito
familiar, porquanto repercutem no erário com o custo elevado de concessão de
auxílios acidente e aposentadorias por invalidez. Esses acidentes, assim,
afetam o PIB e contribuem por elevar o impacto econômico.”, argumenta.
(*)Jornalista formada pelo Instituto de Ensino Superior de Brasília (IESB) e estudante de pós-graduação em Gestão de Comunicação Organizacional no Centro Universitário de Brasília (Ceub).
Nenhum comentário:
Postar um comentário