UM CASO NEBULOSO QUE PRECISA SER
ESCLARECIDO!
(*) DARCI PIRES DA ROCHA
Diante dos fatos acontecidos em Caxias do Sul, com o fechamento da
unidade da Marfrig-SEARA e a demissão de mais de 500 trabalhadores, chegou a
hora dos trabalhadores e da sociedade exigirem providências das autoridades,
uma vez que está claro que esse descalabro é fruto de estratégia empresarial,
apoiada por uma política governamental a nível federal.
Através do BNDES - Banco Nacional do Desenvolvimento, o governo tem
financiado deliberadamente o fechamento de unidades fabris produtivas e a
conseqüente extinção de postos de trabalho, contando com a autorização do CADE
- Conselho Administrativo de Defesa Econômica, que tem assistido passivamente a
monopolização de vários setores da economia, uma vez que o caso SEARA é fato recorrente, já que, só com a Marfrig, o mesmo ocorreu em Roca
Sales e só não aconteceu em Bom Retiro do Sul, graças a resistência dos
trabalhadores e do Sindicato dos Trabalhadores da Alimentação de Estrela, e
tudo isso, curiosamente beneficiando um grande grupo do setor de frangos (BRF -
Brasil Foods), também financiado pelo BNDES, já que a SEARA é uma concorrente
que está sendo retirada do mercado. E que ninguém diga que a fábrica fecha mas
a marca fica, porque isso ofenderia a inteligência dos trabalhadores
Não é de hoje que a sociedade brasileira convive com notícias de
financiamento público na criação de grandes conglomerados empresariais, sejam
por fusões, incorporações, aquisições, etc, sem saber que justificativas ou
mesmo que benefícios levam gestores públicos a investir o dinheiro de todos em
algo particular, cujos lucros são repartidos apenas com sócios, acionistas e
proprietários, nunca com o povo.
A falácia da geração de emprego e renda já não se sustenta mais, uma vez
que todas as "mega empresas" criadas nesses processos podem até ter
gerado mais impostos (mas não convém afirmar dada as renúncias fiscais), mas
emprego e renda? Definitivamente não! Ao contrário, todas as experiências até
agora ( AMBEV, BRF, GOL, etc) reduziram o número de postos de trabalho, com
fechamento de fábricas e concentração de produção. Se alguma coisa aumentou, e
muito, foi o ritmo de trabalho dos que conseguiram manter seus empregos.
Isso é muito ruim no ponto de vista social, e sou absolutamente contra
investimento público nestes casos, mas financeiramente pelo menos, tudo indica
que os exemplos acima citados são sinônimos de investimentos lucrativos, o
que"em tese", deverá garantir a recuperação do dinheiro público
investido. Mas existem casos em que, nem "em tese", isso é garantido!
O exemplo "Marfrig" no Rio Grande do Sul é clássico. Em que se
justifica tanto dinheiro público investido através do BNDES? Geração de emprego
e renda? De forma nenhuma, afinal nos empreendimentos frigoríficos de carne
bovina, ele assumiu plantas que já geravam empregos, advindas da empresa
Mercosul! E nem adianta argumentarem que o Marfrig assumiu pelas dificuldades
financeiras do Mercosul, pois se a antiga empresa tivesse recebido metade do
investimento que o BNDES colocou na Marfrig teria todas as condições de se
manter no mercado.
Se nos frigoríficos bovinos, onde a empresa está sempre alegando
prejuízos para justificar demissões, o investimento público já é, no mínimo,
incompreensivo, o que dizer dos investimentos públicos na Marfrig para compra
da SEARA, ou nas transações envolvendo troca da ativos com a BRF?
Uma coisa é se investir em um negócio, trabalhar durante um tempo e, por
motivos completamente alheios a sua vontade o negócio não dar retorno, pois
todos sabemos que qualquer negócio envolve risco. Mas daí a investir uma
quantidade vultuosa de dinheiro em algo para imediatamente fechar o
empreendimento, demitindo milhares de trabalhadores? É de se imaginar que esse
investidor é louco, pois está rasgando dinheiro! Mas quando esse dinheiro vem
de verbas provenientes do FAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador, como é o caso
da maior parte do dinheiro investido pelo BNDES, ai já é um caso tão grave, que
deveria requerer uma investigação qualificada por parte das autoridades, porque
certamente além de estar faltando responsabilidade no
investimento do dinheiro público, a coisa pode ser bem pior do que isso,
podemos ter um caso clássico de monopólio no mercado usando uma empresa como
"laranja".
Nesse caso (Marfrig-SEARA), seria totalmente justificável a criação de uma
CPI no Congresso, pois o caso suscita muitas suspeitas que precisam ser
esclarecidas pela Direção da Marfrig, BNDES, CADE e pelo Governo Federal sobre
a responsabilidade dos investimentos e, inclusive, o por que do dinheiro dos
trabalhadores está sendo investido para demitir os próprios trabalhadores. Ao
final da investigação não se constatando nada de ilegal ou anti ético,
certamente teremos o relato de um dos mais inusitados casos de "ironia do
destino", onde um fundo está "desamparando" a quem deveria ser
"amparado"!
(*) Vice-Presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da
Alimentação de Pelotas e Coordenador político da sala de apoio da CNTA