Mudanças na CLT não significa modernidade!
Benedito Calheiros Bomfim, do alto de seus quase 96 anos, é, provavelmente, a maior autoridade em Direito do Trabalho no país. Somente isso já justificaria a publicação do texto abaixo. Porém, como acontece com autores realmente importantes, há outra razão, de natureza conjuntural, para publicá-lo.
Há pouco tempo, não mais que algumas semanas, o senador Paulo Paim (PT-RS), na tribuna da casa legislativa de que faz parte, alertou: "Estou sabendo que o Poder Executivo pretende enviar ao Congresso Nacional proposta para mudar a legislação trabalhista e criar duas novas formas de contratação, a eventual e por hora trabalhada. Na prática, nós sabemos muito bem o que isso representa: a perda de direitos sociais para os trabalhadores".
O alerta do senador Paim não é um delírio, pelo contrário. No início deste mês, o jornal Valor Econômico veiculou notícia que a "presidente Dilma Rousseff prepara para depois das eleições municipais a negociação com o Congresso de duas reformas: a da previdência do INSS, em troca do fim do fator previdenciário, e a que flexibiliza a legislação trabalhista, cujo anteprojeto está na Casa Civil e que deverá dar primazia ao que for negociado entre as partes sobre o legislado, ampliando a autonomia de empresas e sindicatos."
Aliás, pela sua importância, transcrevemos alguns outros trechos do pronunciamento de Paim no Senado:
"Tenho o dever e a obrigação de, a partir desta tribuna e utilizando os meios de comunicação desta Casa, fazer um alerta ao nosso País e a nossa gente. Está em plena gestação um processo para flexibilizar a Consolidação das Leis do Trabalho, CLT, a maior conquista social dos trabalhadores brasileiros. Da nossa parte, não aceitaremos em hipótese alguma, a retirada ou a redução de direitos e de conquistas da classe trabalhadora, forjados na luta cotidiana. A partir de hoje, estamos iniciando uma caminhada nacional de mobilização a fim de chamar a atenção de todos para o perigo que se avizinha. Não somos profetas do pessimismo e nem temos bola de cristal para prever o futuro. Porém, a história tem nos mostrado que devemos sempre vigiar e orar. A CLT foi criada em 1º de maio de 1943, pelo então presidente Getúlio Vargas e, em novembro, começou a vigorar. Portanto, em 2013 a CLT completará 70 anos. Ela surgiu de novas demandas do nosso País, que a partir de 1930 deixava de ter uma economia exclusivamente agrícola e passava a se tornar cada vez mais industrial. Novos perfis de trabalhadores surgiam e, nessa leva andarilha para o futuro, como queria Vargas, muitas foram as leis criadas para regulamentar o trabalho. A mobilização popular e a contribuição de vários intelectuais brasileiros foram fundamentais em todo este processo de progresso social e de proteção ao trabalhador".
O senador encerrou anunciando um projeto de lei para que 2013 seja considerado "O Ano da CLT". Baseado nas informações que lhe chegaram, Paim afirmou: "... não podemos fechar os olhos para a ideia que estão tentando vender para a sociedade e que eu considero um engodo. As possíveis mudanças na CLT não representam modernidade. Pelo contrário, elas pretendem desmontar a CLT e acabar, repito, com diretos e conquistas dos trabalhadores".
Além da evidente importância política do tema, há mais a registrar: acabou definitivamente a época em que alguns intelectuais de salão diziam que a CLT era "copiada da Carta Del Lavoro, de Mussolini". A Internet tem o mérito de tornar o texto da última tão acessível quanto o da primeira, impedindo esse tipo de escroqueria.
Como diz o senador Paim, a CLT é "a maior conquista social dos trabalhadores brasileiros" - e, aqui, não acentuaremos sua importância econômica, do ponto de vista de garantir um mercado interno para a indústria nacional, mas ela é, também, evidente.
Não por acaso, desde 1964, todas as modificações que se fizeram ou tentaram fazer na CLT sempre foram para piorá-la. A tese é sempre a mesma: como o Brasil "avançou", é preciso que os trabalhadores tenham menos direitos. O avanço do país, portanto, significa retrocesso para os trabalhadores. Logo, o país mais avançado é aquele em que os trabalhadores não têm direitos...
Sobre isso, o artigo do advogado Benedito Calheiros Bomfim é muito elucidativo. Na época em que Bomfim publicou o texto, o governo Fernando Henrique pressionava o Congresso para modificar o artigo 618 da CLT. Em poucas palavras, queria transformar a lei em letra morta, permitindo que uma falsa "livre negociação" fosse superior a ela - o que é totalmente inconstitucional, por razões óbvias: de que vale uma lei que além de permitir transgressões a si mesma (e não como exceção, mas como regra), também permite transgressões ao artigo 7º da própria Constituição? Imaginemos se a Lei Áurea "permitisse" aos escravos "negociar" sua continuação como escravos...
Um dos grandes momentos do presidente Lula foi quando, logo depois de assumir, em 2003, mandou retirar do Congresso o projeto de Fernando Henrique.
Apesar dos anos que se passaram, o artigo de Benedito Calheiros Bomfim é, considerando nas palavras do senador Paim, perfeitamente atual. (Com jornal Hora do Povo)
Fonte: Diap
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