FORÇA TAREFA, COM PARTICIPAÇÃO DA CNTA, INTERDITA SETORES DA AGROSUL!
O frigorífico Agrosul Agroavícola Industrial S. A., de São
Sebastião do Caí (município da região Metropolitana de Porto Alegre localizado
a 60 km da Capital), foi obrigado, nesta quinta-feira (12/6) pelo Ministério do
Trabalho e Emprego (MTE) a, imediatamente, paralisar máquinas e atividades da
empresa. A decisão é baseada nos termos do artigo 161 da Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT). Foi constatada situação de grave e iminente risco à saúde e
à integridade física dos trabalhadores. A interdição da indústria que abate 76
mil frangos/dia é resultado da quarta força-tarefa estadual de 2014 relativa a
"Meio Ambiente de Trabalho em Frigoríficos Avícolas", realizada de
terça a quinta-feira (10 a 12/6). A diligência foi organizada pelo Ministério
Público do Trabalho (MPT) e pelo MTE, com apoio do movimento sindical dos
trabalhadores, do Cerest e do CREA. Durante a interdição, os 1.283 empregados
da planta devem receber seus salários como se estivessem em efetivo exercício,
nos termos do parágrafo 6º do artigo 161 da CLT. O cronograma de inspeções das
forças-tarefas seguirá até o final do ano, com ações mensais. Em 2015, será a
vez dos frigoríficos bovinos receberem a força-tarefa.
Com fundamento nos dispositivos legais
pelas constatações in loco, ficou determinada a interdição de todos os
trabalhos das seguintes máquinas e atividades: a) uma máquina torno mecânico da
marca Nardini 300 IV e uma máquina esmeril sem identificação, localizados na
Sala de Manutenção; b) atividades de movimentação manual de cargas dos setores
de paletização do setor de expedição (paletização e entrada do túnel de
congelamento) e atividade de descarga do veículo no setor de plataforma; c)
atividades de embalar frango com a utilização de funis e atividade de “bater
produto” do setor de embalagem secundária; d) trabalho na torre de gelo; e)
atividade de abastecer a fornalha da fábrica de farinha. O MTE também embargou
a obra do escritório de expedição e determinou a imediata paralisação do
andaime tubular simplesmente apoiado, das instalações elétricas provisórias,
das duas betoneiras e da serra circular. A documentação foi recebida pelos
diretores industrial Cesar Luiz Assmann e administrativo Milton Bach em reunião
da força-tarefa com a empresa no final da manhã de 12 de junho.
As primeiras três forças-tarefas foram
realizadas nas semanas de 21 de janeiro, de 18 de fevereiro e 23 de abril,
respectivamente nas unidades da Companhia Minuano de Alimentos (Passo Fundo),
da JBS Aves Ltda. (Montenegro) e da BRF S.A. (Lajeado). Todas ações resultaram
em interdições. Como consequência, foi diminuído o excessivo ritmo de trabalho
exigido pelas plantas da JBS e da BRF - dois dos maiores frigoríficos do mundo
- que haviam recebido as primeiras interdições ergonômicas na história
brasileira. As condições antiergonômicas - que sujeitam o corpo humano a risco
de lesão grave por esforços repetitivos, uso de força, posições ou movimentos
que forçam ossos, articulações e músculos de forma antinatural - conduzem a
adoecimentos crônicos que podem incapacitar o trabalhador para qualquer
atividade, inclusive em sua vida pessoal. As duas empresas acataram as
determinações e solucionaram os problemas, removendo as causas das interdições
em menos de uma semana.
Força-tarefa
A força-tarefa teve participação de 21
integrantes. Pelo MPT, estiveram os procuradores do Trabalho Rogério Uzun
Fleischmann (procurador-chefe adjunto), Ricardo Garcia (coordenador estadual do
Projeto de Adequação das Condições de Trabalho nos Frigoríficos, lotado em
Caxias do Sul), Juliana Bortoncello Ferreira (lotada em Novo Hamburgo e com
abrangência em São Sebastião do Caí) e Enéria Thomazini (lotada em Santa Cruz
do Sul). Pelo MTE, participaram os auditores-fiscais do Trabalho Mauro Marques
Müller (coordenador estadual do Projeto Frigoríficos do MTE) e Marlon Martins
(lotados em Passo Fundo) e Ricardo Luis Brand (lotado em Caxias do Sul). O
grupo foi assessoro pela fisioterapeuta Carine Taís Guagnini Benedet (de Caxias
do Sul) e pelo engenheiro de segurança do Trabalho Glenio Pinós Teixeira (de
Erechim).
A ação também foi acompanhada pelo
movimento sindical. Estiveram presentes o dirigente da Confederação Nacional
dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação e Afins para a região Sul
(CNTA-Sul), Darci Pires da Rocha; o presidente da Federação dos Trabalhadores
nas Indústrias da Alimentação do Rio Grande do Sul (FTIA/RS), Valdemir Corrêa;
e integrantes do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação
(STIA) de São Sebastião do Caí: Altair da Câmara Nunes, Adalberto Alexandre
Machado e Mauri Coelho.
Pelo Centro de Referência em Saúde do
Trabalhador (Cerest) Canoas-Vale dos Sinos, formado há um ano, estiveram a
coordenadora Marta Boeck, o enfermeiro do Trabalho Cleber Brandão, a técnica em
enfermagem Jéssica Lais Costa Pedroso e o agente de fiscalização Marcelo
Barcellos Von Marées. Pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do
Estado do Rio Grande do Sul (CREA-RS), participaram os supervisores de
fiscalização David Grazziotin Rosa (de Porto Alegre) e Alessandra Maria Borges
(de Caxias do Sul), além do agente-fiscal Everaldo João Daronco (de Panambi). O
programa televisivo Trabalho Legal, produzido pelo MPT e veiculado aos sábados,
às 22h, pela TV Justiça, foi gravado no local pelos jornalistas Marcela Buzelin
(editora-chefe e apresentadora) e Ailton Maximino (repórter cinematográfico) e
será exibido nas próximas semanas.
Avaliações
O Projeto do MPT visa a redução das
doenças profissionais e do trabalho, identificando os problemas e adotando
medidas extrajudiciais e/ou judiciais. Para o procurador Ricardo Garcia,
"a causa principal dos problemas encontrados na Agrosul é, mais uma vez, a
falta de gestão de risco. A empresa negligencia o Serviço Especializado em
Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT) e a Comissão Interna
de Prevenção de Acidentes (CIPA), e os programas de prevenção são meramente
formais. Há total desconhecimento por parte dos profissionais e dos
trabalhadores sobre os riscos e agravos sofridos pelos empregados. E o ambiente
de trabalho se caracteriza, também, pelo medo de punições e despedidas por
justa causa, o que é indício de que pode estar havendo a prática de assédio
moral, o que será objeto de investigação mais profunda por parte do MPT".
Sindicalistas
O dirigente da CNTA-Sul, Darci Rocha,
avaliou como "de suma importância a força-tarefa, porque só através dela
as entidades sindicais dos trabalhadores conseguem ter acesso ao chão de
fábrica. O MPT e o MTE podem mudar a realidade do setor de frigoríficos, porque
os sindicalistas não têm poder de autuação e interdição, ferramentas da
força-tarefa. A aplicação e fiscalização da NR 36 é fundamental para a
dignidade dos trabalhadores do ramo da alimentação".
O presidente do STIA, Altair Nunes,
enalteceu a força-tarefa, porque ajuda nas atividades do sindicato. "A
gente fica só naquela de fazer pesquisas, receber denúncias dos trabalhadores e
cobrar da empresa. A gente espera, a partir da força-tarefa, obter melhorias
para o setor, como local de trabalho adequado e que aconteçam a quarta e a
quinta pausas, conforme prevê a NR-36. A empresa já assinou termo de
ajustamento de conduta (TAC) e não está cumprindo". A Agrosul faz três
pausas de 10 minutos no próprio ambiente de trabalho, quando o mínimo são cinco
pausas de 10 minutos em ambiente diferente e salúbre.
Parceiros
Conforme o Cerest, "o trabalho
conjunto foi fundamental para a definição de ações na área da saúde do
trabalhador. Ao efetivar uma inspeção nas áreas produtivas, estando ao lado do
trabalhador e observando a sua rotina, pode se fazer - de fato - um
levantamento e aprimorar sobremaneira os processos de segurança. Os acidentes
com trabalhadores que atuam em frigoríficos são preocupantes e os números
apresentados são alarmantes. Para o Cerest, de abrangência regional, é preciso
discutir, principalmente, as condições de segurança destes trabalhadores,
exigir o cumprimento da Norma Regulamentadora (NR) e lutar pela redução da
jornada de trabalho, a fim de melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores.
As doenças ocupacionais, subnotificadas ou não notificadas, são outro fator
importante para investigação do Cerest. A realidade é infinitamente maior do
que aparece nos dados: os trabalhadores que atuam em frigoríficos adoecem pelas
condições extenuantes no trabalho e o custo social é muito alto. Mas esses
números não aparecem, o que dificulta o trabalho de prevenção".
No ambiente de trabalho, na avaliação do
Cerest, há sobrecarga aos trabalhadores da Agrosul no que se refere ao ritmo na
nória transportadora que, ao imprimir maior velocidade, acumula produtos na
esteira, ocasionando pressão e cobrança dos supervisores. Essa pressão diária
envolvendo metas a serem cumpridas afeta a integridade física e emocional dos
trabalhadores, com grande incidência de problemas osteomusculares, somados aos
problemas psicológicos. Há relatos de distúrbios do sono, sentimentos de
desistência, ímpetos agressivos e revolta. As dores nos braços, pernas e coluna
são as queixas de maior incidência. A utilização dos membros superiores em
movimentos repetitivos, com utilização de facas e em um ritmo de cadência
constante, elevam o risco de acidentes graves. O Cerest observou que a faixa
etária dos trabalhadores é muito jovem, de 22 a 30 anos, com relato de
afastamento nos primeiros três meses de trabalho. Para a saúde mental, o
ambiente é totalmente hostil, com privação total da criatividade e de qualquer
potencialidade individual. O indivíduo está inserido na automação e passa a ser
parte dela. O objetivo do Cerest é a análise desses riscos para propor
melhorias nas condições de trabalho. Como os distúrbios estão relacionados
sobremaneira ao ritmo de trabalho, os programas de prevenção precisam ser
priorizados. A equipe do Cerest teve "percepção de temor, opressão pela
insegurança, medo de ser despedido, caso faça algum relato, e dificuldade de
aproximação com os trabalhadores".
Para os agentes-fiscais do CREA,
"esta ação integrada de fiscalização na Agrosul, se torna um 'case de
fiscalização' em frigoríficos e afins, em função do aprofundamento que pôde ser
feito na fiscalização e análise das atividades e documentos, verificando a
efetiva participação técnica de empresas e profissionais habilitados (através
do registro da Anotação de Responsabilidade Técnica - ART), face aos serviços e
atividades de manutenções e instalações(prediais,equipamentos, máquinas,
caldeiras e vasos de pressão), laudos técnicos, inspeções e licenças, no devido
cumprimento da Lei Federal 5.194/66". O CREA solicitou para a Agrosul a
apresentação de documentos indicando quem é o responsável técnico pela
manuteção das máquinas, do plano de prevenção contra incêndio (PPCI), do quadro
técnico da empresa com a respectiva descrição sumária das atividades
desenvolvidas. O prazo concedido foi de dez dias. Em caso de descumprimento, o
CREA comunicará ao MPT.
Empregados
Ao saberem da presença da força-tarefa,
alguns trabalhadores aguardaram, no início da manhã do segundo dia, a chegada
da equipe no pátio da fábrica para relatar irregularidades cometidas pela
indústria. Em depoimentos tomados pela procuradora Enéria, afirmaram ter
dificuldades em obter atendimento médico e aceitação de atestados. Também
informaram que o trabalho é em ritmo intenso com jornada extenuante. A gestante
Jéssica Letícia Rambo, 19 anos, disse ter sido despedida por justa causa, com
seis meses de gravidez, porque precisou se ausentar por nove dias, devido a
adoecimento. Ao retornar, a empresa não aceitou o atestado e a dispensou por
abandono de emprego. Já a funcionária Cristiane de Oliveira Rodrigues, 22 anos,
que está de licença médica, procurou o médico da empresa, mas não conseguiu ser
atendida, tendo que procurar atendimento no hospital. Mesmo com atestado, que
foi entregue em 11 de junho, a supervisora a mandou trabalhar. Também garantiu
que foi trocada de setor sem justificativa da empresa. O funcionário Marcos
Romano da Rocha, que concedeu entrevista na tarde anterior ao programa Trabalho
Legal, comunicou à força-tarefa que acabara de ser despedido.
Texto, fotos e vídeos: Flávio Wornicov Portela (reg. prof. MTE/RS
6132) enviado especial
Publicação no site do MPT: 12/6/2014